E viveram todos felizes para sempre entre lagos e guarda-sóis. Na Primavera encurtavam as saias ao ritmo do amadurecimento da flor e, entre sorrisos e suspiros, até se vivia com dignidade. Mas o para sempre começou a demorar muito tempo a acabar, as ervas secaram, os olhos em rugas, o vinho entornava, mãos em cruz, e todos se aborreceram com tanta água e sol. A 12 de Março inscreviam-se no Clube Conservador da Caça à Borboleta e enchiam o edifício dos serviços Prisionais de Asas Flutuantes com milhares de espécies - era um arco-íris violento de se ver.
E talvez por isso, ou talvez por outra loucura qualquer, a 21 de Março logo se revoltavam - os mesmos que foram ferozes caçadores - e se convocava uma magna reunião da qual brotaria a União Internatural de Defesa de Seres Voadores Visíveis ou Invisíveis Feios ou Bonitos. Convocavam-se manifestações, acções de campanha, jornadas de luta clandestina e aguardava-se com inquietação de herói o assalto final ao edifício prisional. Bandeiras coloridas, achas, acordeões, rugidos de leão, anéis de fogo a saltar de orelha em orelha - tudo em cortejo até às portas largas da grande gaiola.
Como se constituísse novidade, portões abertos denunciavam um edifício deserto, descuidadamente abandonado, ocupado por crias de aranha sem meios nem recursos para impor o clima de disciplina desejável em tão sagrado local.
A invasão ingénua limitava-se então a um desiludido abrir das celas e um desfrutar do voo precipitado das borboletas ao som de 'vivas', uivos, gritos de liberdade e de 'não havíamos sido nós a prendê-los'?.
E assim, sempre assim, passavam as Primaveras, todas as Primaveras do para sempre que já era manco e nem tinha Verão.